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Prof. Dr. Claudefranklin Monteiro Santos

No que se refere ao conhecimento sobre danças e folguedos da cultura sergipana, ainda presente em nosso tempo, pode-se creditar a uma tríade lagartense: Sílvio Romero, Beatriz Góis Dantas e Aglaé Fontes. Sem deixar de mencionar, também, a contribuição de um quarto sujeito das terras de Nossa Senhora da Piedade: Luiz Antônio Barreto (1944-2012). Da recolha aos estudos e análise a respeito da temática, em grande medida muito se perpetuou no tempo e alguma coisa, não raro, também se perdeu, sobretudo na prática e nas vivências diárias dos municípios e lugarejos sergipanos.
Na segunda metade do século XIX, o interesse pelo chamado conhecimento popular cresceu consideravelmente, não somente na Europa, mas também no Brasil. Para este tipo de estudo da manifestação espontânea do fazer e do saber fazer da gente mais simples deu-se o nome de folclore. Os folguedos passaram a fazer parte dos interesses de pesquisa de sujeitos como Sílvio Romero (1851-1914), notadamente em duas obras: Cantos Populares do Brasil (1883) e Contos Populares do Brasil (1885). Para Luís de Câmara Cascudo: “constituem o primeiro documentário da literatura oral brasileira” (p. 17, 1985).
Importante dizer que àquela época, o interesse pelo folclore era apenas uma curiosidade e não mereceria a tenção da douta ciência até Sílvio Romero entrar em cena e lhe merecer a atenção necessária. Que o diga o trabalho subsequente de Alexandre Melo Morais Filho: Festas e Tradições Populares do Brasil (1895). No prefácio desta obra, Romero define bem o que são os folguedos: “Naturezas sadias, fortes, nativamente voltadas à alegria, ao divertimento, à vida folgazã e despreocupada de nossas classes populares, naquilo que elas têm de mais seleto, de mais original, de mais fundamentalmente puro...” (p. 16, edição de 2002). 
Melo Morais ao tempo que nos presenteia com o um vasto conhecimento sobre a temática, também deixa um legado para lembrar sempre, do que já tivemos e ainda resiste bravamente ao tempo. Um volumosa obra com mais de 360 páginas, dividida didaticamente nas seguintes partes: festas populares (destaque para a festa de São Benedito em Lagarto, que eu me debrucei em tese de doutorado em História pela Universidade Federal de Sergipe, publicada em livro pela EDISE em 2016); festas religiosas (com destaque para a Encomendação das Almas); e tipos de rua, das quais muitas não existem mais, salvo a capoeiragem.
No intervalo temporal de pelo menos noventa anos, seja em nível nacional, seja em nível local, muito se produziu a respeito, ressaltando aqui iniciativas particulares como as de Serafim de Santiago, em seu Anuário Cristovense, do início do século XX; Alberto Deodato (Senzalas, Contos, 1919); Prado Sampaio, com Sergipe Artístico, Literário e Científico, de 1928; Mário Cabral, com o seu Roteiro de Aracaju, 1948; entre outros.
Nos anos 70, o destaque vai para Luiz Antônio Barreto, que em Sergipe levou adiante uma série de iniciativas que foram ao encontro da política de valorização do folclore brasileiro, implementada pelo Ministério da Educação e da Cultura, bem como de instituições a exemplo do Departamento de Assuntos Culturais, da Fundação Nacional de Arte (FUNARTE), da Campanha de Defesa do Folclore Brasileiro e da Secretaria de Educação e Cultura de Sergipe, através de seu Departamento de Cultura e da Comissão Sergipana de Folclore.

Foto: Destino Sergipe
Como resultado prático disso, destaco duas iniciativas: o compacto disco “Chegança – Sergipe”, de 1976, da coleção Documentário Sonoro do Folclores Brasileiro, nº 16. Bem como, dos Cadernos de Folclore, alguns dos quais de autoria de Beatriz Góis Dantas, de que trataremos a seguir. Anos depois, em 2005, pela editora Scortecci, Luiz Antônio reuniu seu vasto conhecimento sobre o assunto em “Folclore – Invenção e Comunicação”, onde ele dedica um capítulo a Sílvio Romero e os primórdios da pesquisa folclórica.
Ainda nos anos 70, para ser mais exato em 1972, a lagartense Beatriz Góis Dantas publica seu magistral trabalho “A Taieira em Sergipe”. Para José Calasans, trata-se do “(...) primeiro livro especialmente escrito sobre a função popular das negras e mulatas de Laranjeiras dirigidas, há muitos anos, pela mais famosa mãe-de-santo de Sergipe, a velha Bilina” (p.14, 1971). Nessa esteira, Beatriz ainda escreveu e publicou diversos estudos nessa seara dos folguedos sergipanos, dos quais destaco: “Mensageiros do Lúdico – mestres brincantes em Laranjeiras” (2013); “Devotos dançantes” (2015) e também neste mesmo ano, “Encontro Cultural de Laranjeiras – 40 anos do simpósio”, do qual ressalto o ano de 1983, dedicado à Música Folclórica; o ano de 1984, à Religiosidade Popular; 1987, às Danças e Folguedos; entre outras edições onde a temática veio à baila.
A esse cenário, acrescento ainda as contribuições de Jackson da Silva Lima, exímio pesquisador e ensaísta de Literatura Sergipana, mas também da cultura popular sergipana; e também, de outra lagartense, a professora Aglaé Fontes, de cuja seara, ressalto trabalhos como: Caderno de Arte e Educação, 1995; Danças e Folguedos, 2003; Cartilha Cultural de Laranjeiras, pelo IPHAN-SE, 2009; e Projeto Patrimônio Cultural – Série Memória, 2012, ao Mestre José Gonçalo dos Santos (Rindu).
Passados quase 140 anos desde a primeira grande publicação sobre o folclore nacional, o conhecimento sobre as danças e folguedos sergipanos seguem devidamente registrados graças a iniciativa de quatro lagartenses, em diferentes momentos da história do Brasil. Seus trabalhos, além de garantirem a memória do que se teve notícia, notadamente de forma oral, também se constituíram em grandes referências para novos estudos, que seguem sendo gestados, seja em nível científico, seja por meio de outras iniciativas que também merecerem a nossa atenção e cuidado.